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10 de Setembro de 2012 | | | | | |

Uma história de morte

“Para um pobre não há justicia, somente luta, essa é a realidade que nós sentimos”

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Mariano Castro mora na comunidade de Yvy Pytã, a cerca de 30 quilômetros da localidade paraguaia de Curuguaty, departamento de Canindeyú. Sua casa fica a cinco quilômetros aproximadamente da área de Marina Cué, do outro lado da Rota 10 “As Residentas” e onde no dia 15 de junho a repressão policial assassinou 11 camponeses sem terra. Mariano perdeu ali um de seus filhos e outros dois foram feridos e estão presos.

Adolfo tinha 28 anos e dois filhos. Adalberto teve uma ferida de bala em uma de suas pernas e está preso na cadeia regional de Coronel Oviedo, departamento de Caaguazú. Néstor, também detido, está em Assunção, capital paraguaia, para tratar sua ferida na mandíbula.

Seu pai, o presidente da Comissão de Vítimas do grupo de familiares dos camponeses caídos no massacre, onde também foram assassinados seis policiais.
Marina Cué está irregularmente em mãos da empresa agrícola pecuária Campos Morombí, do empresário e ex-político do Partido Colorado Blas Riquelme, morto no dia 2 de setembro.

A informação que tem Mariano é de que seu filho Adolfo foi executado. Antes de perder sua vida havia entregado seu filho de três anos a uma jovem, que nunca soltou a criança durante o inferno do ataque policial. Protegeu ele durante o tiroteio ficou horas com ela, até após ter sido detida. Entregou a criança no centro de saúde de Curuguaty, onde chegou ferida e detida. Seu nome é Alicia Agüero e está presa em Coronel Oviedo.

“Tenho certeza de que todos os que morreram ali eram sem terra, verdadeiramente sem terra, e não eram delinquentes. Todas eram pessoas trabalhadoras e queriam um pedaço de terra e por esse motivo perderam sua vida”, disse à Rádio Mundo Real Mariano.

A reafirmação de Mariano de que os caídos de Marina Cué não eram delinquentes não é fortuita. É uma resposta a grande parte da imprensa paraguaia, conservadora e associada ao poder político e econômico tradicional do país, que não duvidou em afirmar que aqueles que ocupavam Marina Cué eram delinquentes ou terroristas. “Eram inocentes”, disse Mariano.

O presidente da Comissão de Vítimas dos familiares dos assassinados em Marina Cué também lamenta por seu filho ferido na mandíbula e preso. Até agora só está sendo alimentado com líquidos. “Se um humano ferido está na cadeia para mim é injusto”, e concluiu que “o direito humano não existe”. Mariano não pode visitar seus filhos quanto quiser. Em meio de penúrias econômicas, é impossível pagar viagens até Coronel Oviedo ou Asunción reiteradamente.

As reivindicações dos familiares dos camponeses mortos em Marina Cué são três bem concretas: liberação dos detidos e a absolvição dos 54 prófugos, ressarcimento econômico dos familiares dos mortos e entrega das terras em disputa aos camponeses sem terra que as exigem. “De 2003 nós sabemos que é terra do Estado, não é uma propriedade privada”, disse Mariano, que explicou que essa certeza permitiu a luta camponesa pelas terras de Marina Cué há nove anos.

O relato de Mariano sobre o agir da polícia no dia da matança (realizada cedo na manhã) e a primeira resposta camponesa, reforça em boa medida o dito nos testemunhos dos habitantes da zona, os detidos, outros familiares dos camponeses mortos e outras fontes consultadas. Houve cerca de 400 policiais no operativo, que incluiu um helicóptero, policiais à cavalo, cerca de 25 patrulheiros e até ambulâncias e enfermeiras preparadas. Os camponeses eram cerca de 60 e foram encurralados. Os sem terra pediram à polícia para dialogar, mas não houve opções, conforme contam os camponeses.

Existe outra coincidência importante nas declarações. Vários camponeses foram executados quando já estavam feridos, no chão ou enquanto corriam para salvar sua vida. Alguns dos campones mortos teria caído durante o fogo generalizado. Muitos sem terra tentaram fugir do lugar e foram perseguidos pelos policiais.

Sobre os policiais mortos e a posse de armas dos camponeses existem versões diferentes. Algumas indicam que os sem terra não tinham armas de fogo, ou que não tinham armas no momento do ataque policial. Outra fonte disse que alguns camponeses tinham escopetas.

Esses são alguns dos relatórios surgidos durante a Missão Internacional de Solidariedade e Direitos Humanos realizada no Paraguai, e que de quinta até sábado visitou a zona do “massacre de Curuguaty”. Participaram a Coordenadora Latinoamericana de Organizações do Campo (CLOC) – Vía Campesina, FIAN Internacional, o Grupo de Pesquisa em Direitos Humanos e Sustentabilidade da Cátedra UNESCO da Universidade Politécnica de Cataluña, a Campanha Global pela Reforma Agrária e Rádio Mundo Real.

Os filhos de Mariano disseram a seu pai que os camponeses haviam colocado um cartaz diante dos policiais que dizia “vencer ou morrer”. “Eles queriam resistir porque já faz mais de nove anos de luta (pelas terras de Marina Cué), porque eles sabiam bem que (essas terras) não é de propriedade privada e sim do Estado”, explicou Mariano.

A comunidade de Yvy Pytã ficou abatida depois do dia 15 de junho. Ali estão muitos dos familiares dos camponeses caídos e pessoas que fazem parte da luta por Marina Cué. Uma das informaççoes é de que os sem terra foram infiltrados antes do operativo. Por isso o sentimento de desconfiança surgiu na zona. Mas conforme os moradores, lentamente começaram a falar e se reorganizar. Expressam que não deixarão de lutar até que Marina Cué seja sua. “Mais do que nunca unimos critério e temos força para conquistar essa terra. Não vamos deixar plantar soja mais sobre o sangue caído de nossos companheiros e filhos”, disse Mariano, que reconheceu que a comunidade “está muito dolorida”.

“Tomara que as autoridades do Paraguai aceitem sua responsabilidade”, disse à Rádio Mundo Real no fim da entrevista. “Aqui no Paraguai somente existe justiça para os ricos, os latifundistas e os grandes empresários”. O pobre só pode lutar, disse Mariano.

Foto: Radio Mundo Real

(CC) 2012 Radio Monde Réel

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