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13 de Fevereiro de 2013 | | | | |

Polochic: “nos tiram aquilo que nos da sustento”

Há dois anos do massacre que expulsou 700 famílias camponesas em Valle del Polochic (Guatemala): descumprimentos, fome e resistência

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O violento desalojamento no Valle del Polochic, na Guatemala, de 700 famílias camponesas indígenas maias para benefício da indústria do etanol, em março de 2011, é revivido nestas entrevistas realizadas pela jornalista sueca Lina Karlsson, da organização Solidariedade Suécia-América Latina (SAL). Como têm vivido desde então as famílias desalojadas? Quem se beneficiou da violência do Estado e da força comandada pelo presidente Otto Pérez Molina?

A Europa é o terceiro maior consumidor mundial de etanol. Os agrocombustíveis estão de moda nesse continente, sobretudo pelo objetivo da União Europeia (UE) de aumentar ouso do que chamam “energias renováveis”.

A Guatemala produz cana-de-açúcar e óleo de palma que são utilizados para a produção de etanol e biodiesel, que se mistura com as gasolinas para alimentar os automóveis na Europa e nos Estados Unidos.

A jornalista Lina Karlsson, integrante da equipe de SAL, visitou Valle del Polochic para conhecer as causas e consequências do desalojamento ocorrido em 2011 quando as moradias precárias e cultivos de alimento diário de muitas famílias camponesas foram queimados, arrasados, para permitir que a empresa Chabil Utzaj o cultivo extensivo de cana, matéria-prima de etanol.

Rádio Mundo Real oferece uma produção com base nas entrevistas ali realizadas, e na visão da comunicadora sueca.

O feijão de Cecilia

Na comunidade “8 de Agosto” vivem 125 das famílias desalojadas em lares temporários. O governo tem se comprometido a dar terra a 300 famílias atingidas pelos desalojamentos; no entanto, apesar da pressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ainda não tem cumprido sua promessa.

Cecilia Rax Yat é uma das moradoras dessa comunidade. Ela estava em sua casa no povo KeQuinich com seus cinco filhos e seu esposo quando a polícia, os militares e os guardas de segurança chegaram.

“Sou uma mulher camponesa trabalhadora. Vivo pelo milho e o feijão, mas isso não lhes importou”, nos diz Cecilia.

“Cortaram os cultivos, tudo o que a mãe natureza nos havia dado para comer. Nos ameaçaram quando chegaram, por isso decidimos sair de casa. Nos deixaram na rua sem importar a saúde ou a alimentação de meus filhos, o que vou dar de comer para eles?”, pergunta Cecilia.

Depois do desalojamento queimaram a casa da família de Cecilia. “ Todas nossas roupas foram queimadas”, acrescenta em sua língua maia. Cecilia transmite a angústia por que o governo ainda não tem cumprido sua promessa de dar aos habitantes de Polochic acesso à terra.

Desde o século XIX

Para entender o conflito de terra em Polochic, é preciso voltar a fins do século XIX quando Guatemala se abriu aos investimentos estrangeiros. Os alemães foram até o vale de Polochic, uma zona já povoada, estabelecendo fazendas de café. Muitos dos habitantes de Polochic começaram a trabalhar nas plantações, enquanto outros tomaram terras.

Muitos dos donos das fazendas de café, acabaram vendendo suas terras à empresa de cana-de-açúcar Chabil Utzaj, que nesse então era propriedade da família Widmann da Guatemala.

Os desalojamentos começaram quando o Grupo Pellas, a família e empresa mais poderosa da Nicarágua, comprou a companhia em 2011. Chabil Utzaj argumenta que foram realizados os desalojamentos porque a terra estava ocupada e que "era impossível chegar a uma solução através do diálogo".

Durante o desalojamento, que durou seis dias, assassinaram um camponês e vários foram feridos. Mais tarde no ano aconteceram mais ataques e outros dois camponeses foram assassinados. Ao todo, cerca de 700 famílias tiveram que abandonar seus lares.

A maioria também perderam todas suas colheitas. Para os camponeses, que vivem principalmente do que eles mesmos plantam, a perda da terra e os cultivos foi fatal. Em 2011 também houve crise de fome no país. Inclusive hoje em dia a população está sofrendo as consequências do desalojamento forçado.

Somente o chefe de polícia local foi responsabilizado pelos fatos, e já recuperou sua liberdade. A força de choque que expulsou as famílias esteve composta por policiais, militares e a própria guarda de segurança da empresa.

Negócio crescente

No entanto, isto é visto pela União Europeia como uma oportunidade de novos e mais lucrativos negócios.

No começo de dezembro de 2012, o Parlamento da UE aprovou acordos de livre comércio com a América Central, Colômbia e o Peru. Todos os membros da UE têm que ratificarem os acordos, mas a parte comercial entrou em vigor depois da decisão de aprová-los.

O acordo significa a eliminação das tarifas de exportação a produtos como o óleo de palma e a cana-de-açúcar, que são utilizados para a produção de etanol.

É de se esperar que as exportações de etanol da Guatemala para a Europa aumentem ainda mais. Também será mais fácil para as empresas europeias se estabelecer na Guatemala e competir com os camponeses locais.

O habitante da comunidade Bella Flor, Samuel Q’ucur, também foi entrevistada pela jornalista de SAL, destacando que os filhos das famílias camponesas tiveram que abandonar a escola ao se encontrarem dispersos e em lugares distantes de centros de estudo.

E destacou que o governo guatemalteco não tem cumprido com as promessas de terras para cultivos e alimentos básicos para paliar a escassez alimentar, enquanto as famílias conseguem reiniciar seus cultivos.

“Os acordos de livre comércio produzem monoculturas e a apropriação de terras. Não haverá terra para cultivar alimentos para comer, como o milho e a mandioca. As monoculturas também contaminam a água”, diz por sua vez Esteban Hermelindo Cux, do Comitê de Unidade Camponesa (CUC), parte da Via Campesina Guatemala.

“Como vão poder escapar da pobreza se lhes tiraram a terra, e com isso a capacidade e possibilidade de se alimentarem eles mesmos, suas famílias e comunidades? Não creio que estejamos falando de desenvolvimento. Que tipo de desenvolvimento? Nos tiram nossa terra, do que vivemos”, diz Esteban.

Para Esteban a luta dos ex-moradores de Polochic continuará até a recuperação das terras e a expulsão da empresa. Sabe que para isso será necessária muita resistência e desconta a reação violenta e muitas vezes mortal, de privados e governantes.

O dirigente camponês observa as plantações de cana-de-açúcar que cercam as casas no dia 8 de agosto: “aqui poderiam ter plantado milho”, diz.

Produção e fotografias de Lina Karlsson (Solidariedade Suécia América Latina, SAL)

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